terça-feira, 9 de fevereiro de 2016

#68 Dentro

Ela descobriu o amor-próprio, resultado de inúmeras desilusões amorosas, umas apenas platónicas, outras não correspondidas e uma tentada e falhada. Ela já havia desistido de encontrar alguém que a amasse tal como ela se disponibilizava para amar. Para ela amar só era possível de corpo inteiro, entregava-se totalmente, daí que tenha sofrido tanto por amor. Sabia agora que não era assim, o que a fazia sofrer era essa sensação de incompletude, sensação de falta que projetava no outro na esperança que a completasse. Aprendeu que ninguém teve culpa pela sua falta de amor, pois ele sempre esteve dentro de si. 

#67 Amor não correspondido

Todo o amor não correspondido aponta para o verdadeiro amor e esse amor reside dentro de cada ser humano. É essa a sua essência. Como tal todo o amor correspondido é uma ilusão divergente da atenção do que é essencial, enquanto acreditarmos que outra pessoa nos pode dar o amor que cremos faltar, mais iludidos sobre quem somos estamos. A desilusão amorosa é um encurtar do caminho para a verdade. Seguindo esse caminho o quanto antes, mais livre ficamos para viver em pleno o amor que somos. Amor esse que nada exige, nada necessita e tudo partilha, seguro de si.

#66 Pulsão interior

Nada é suficiente quando desconhecemos quem somos de verdade. Essa ânsia por ser mais, por encontrar um amor real, leva a uma busca incessante. Cada rosto é perscrutado na tentativa de encontrar a tal, a tão almejada cara-metade. Pura ilusão, pois cara alguma existe pela metade, mas como esquecemos isto, a busca torna-se perene. Mesmo quando encontramos alguém que se voluntaria, ainda que inconscientemente, para representar esse papel, de alguém que nos completa, rapidamente essa pulsão interior faz emergir a busca. Não tem fim tal situação até que nada mais reste a não ser o próprio e as suas ideias.

#65 Insatisfação

A realidade em que vivia era insatisfatória, o que quer que trouxesse algum ânimo à sua existência era passageiro, em pouco tempo desvanecia tal satisfação e o que relevava com mais força era essa insatisfação crónica. Como era difícil viver a rotina do dia-a-dia quando tudo se tornava escasso, quando tudo ficava aquém do seu padrão de exigência. Nada parecia poder solucionar tal busca incessante por algo que fizesse, pelo menos diminuir tal insatisfação. Por mais que tentasse nada havia resultado. Um dia porém, um estranho dirigiu-se a ela e disse-lhe a paz que procura reside dentro de si, liberte-a. 

segunda-feira, 1 de fevereiro de 2016

#64 Estória

A dor perpassava todo o seu corpo, não havia pedaço dela em que a dor não se fizesse sentir. Mas o pior desta dor é que ela não é uma dor física, ela é inteiramente mental. E no entanto faz-se sentir de múltiplas maneiras nela. Sem saber mais o que fazer, como lidar com tal dor, ela havia decidido desligar-se do mundo. Fechando-se no seu quarto, enroscando-se em torno da dor que sentia, ela permitiu-se entregar à dor. Resolveu viver cada sensação, observar como se manifestava ao longo do seu corpo. Algo mudou, percebeu que tudo era uma estória acontecendo. 

#63 Pensamentos

Ela pensou: morreu a vida em mim que julgava viver, convencida que era o fim da minha história, que nada mais restava para mim, desisti. Prostrada no âmago do meu ser, entreguei-me ao destino. Não importa mais o que me aconteça, seja o que for, que aconteça rápido e que faça terminar este sofrimento, esta angústia de não saber, de não ter rumo que seguir. O que será de mim, não me importa mais. Cansei de viver esta batalha constante contra as adversidades. As forças que me restavam esvaíram-se. Não sei mais o que fazer. Como dói tudo isto. Silêncio 

#62 Entregue à verdade

A vida pensada abandonou-me, fiquei entregue a mim mesmo. Julgava ter ficado perdido e no entanto o contrário era a realidade. Livre do que pensava ser, o que restou foi aquilo que sou de verdade. O que parecia ser menos revelou-se abundância. Um entendimento de que tudo é perfeito assim como é, espraiou um manto de harmonia e paz em mim e em tudo o que me rodeava. Por fim podia descansar de uma guerra que havia batalhado a vida toda e que nem tinha a noção estar a travar. Quando o esforço de controlo acabou tudo ficou mais simples.